.comment-link {margin-left:.6em;}

Esse blog é destinado a promover o debate de temas culturais e sociais, além de divulgar as ações realizadas por jovens moradores da comunidade São Remo, no bairro do Butantã (SP).

sexta-feira, janeiro 13, 2006

MULHERES JÁ SUPERAM HOMENS NA ESCOLA

Segundo pesquisa, cinco indicadores mostram vantagem feminina; diferença entre negros e brancos diminui


Antônio Gois (*)

Para um país cuja marca maior é a desigualdade, a comparação de cinco indicadores educacionais entre 1992 e 2004 traz boas notícias: está diminuindo a distância que separa homens de mulheres e negros de brancos. Uma comparação feita a partir da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) pelo sociólogo Simon Schwartzman, presidente do Iets (Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade) e ex-presidente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mostrou que mulheres e homens e negros e brancos terminaram 2004 mais próximos do que estavam em 1992. No caso das mulheres, a evolução foi tanta que já aponta para um novo problema: como fazer com que a desvantagem dos homens em relação a elas não aumente. Já quanto aos negros (pretos e pardos), o quadro mostra que, apesar dos avanços, a desigualdade ainda é marcante. Foram comparados anos médios de estudo da população com mais de 25 anos, taxa de analfabetismo adulto, percentual de freqüência à escola de 7 a 14 anos e defasagem e atraso escolar entre os 10 e 14 anos. Os avanços mais significativos na redução da desigualdade foram nos indicadores da população de 7 a 14 anos após a quase universalização do ensino nessa faixa etária e a diminuição significativa da defasagem escolar. Na comparação de indicadores que levam em conta a população adulta, também houve redução, mas ela foi menos intensa porque, como se trata de todo o conjunto da população adulta, as mudanças demoram mais a surtir efeito.

Gênero
Na comparação entre sexos, as mulheres começaram a década passada em desvantagem em dois dos cinco indicadores: média de anos de estudo da população e taxa de analfabetismo adulto. Doze anos depois, já superavam eles em todos os quesitos analisados. Naqueles em que desde 1992 a comparação já era favorável às mulheres (freqüência e atraso escolar), no entanto, houve diminuição na distância que as separava dos homens. De 1992 a 2004, a diferença a favor das mulheres em pontos percentuais caiu de 2,9 pontos para 0,9 no quesito freqüência escolar e de 8,6 para 6,3 na comparação entre as taxas de defasagem (veja quadro ao lado).

"As mulheres estão tendo um desempenho educacional muito melhor do que os homens. É um fenômeno importante que mostra que houve uma inversão", afirma Schwartzman. Para ele, a distância a favor das mulheres cria um novo problema: "Nos países africanos, a discussão é sobre como fazer para que as mulheres tenham as mesmas oportunidades educacionais do que os homens. No Brasil, a preocupação é oposta".

Raça
Entre negros e brancos, a queda da desigualdade pode estar revertendo, mesmo que lentamente, um quadro apontado num estudo de 2001 do Ipea feito por Ricardo Henriques, hoje secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC. Ele comparou a escolaridade média de negros e brancos desde 1929 e concluiu que "as curvas parecem construídas com intencional paralelismo, descrevendo, com requinte, a inércia do padrão de discriminação racial".

Nos últimos 14 anos, no entanto, a Pnad indica alteração nesse quadro. Em 1992, 2,3 anos de estudos separavam negros e brancos. Doze anos depois, essa diferença caiu para 2,1. Para Simon Schwartzman, não se pode dizer ainda que essa queda seja significativa, mas os indicadores que apontam para o futuro e os de analfabetismo mostram avanços. A diferença no percentual de crianças que freqüentam escola entre brancos e negros, por exemplo, caiu de 12,5 pontos para 2,8.

"Hoje, com o acesso praticamente universalizado da escola na faixa etária de 7 a 14 anos, a principal diferença entre brancos e negros deixa de ser no acesso e passa a ser no desempenho", diz Schwartzman, citando um estudo feito pelo pesquisador da PUC-Rio, Creso Franco. Esse estudo comparou notas do Saeb (exame do MEC que avalia a qualidade da educação) e mostrou que negros, mesmo em situação socioeconômica semelhante, tinham médias menores. O estudo explicava a diferença como uma forte evidência de preconceito na escola.

PERSONAGEM: Universidade deu para família salto educacional


Negra e mulher, a entrada de Mirian Costa da Silva, 29, numa universidade representou para sua família um enorme salto educacional entre gerações. Seu pai, o ex-pedreiro e hoje office-boy José Benedito da Silva, fez somente um curso de alfabetização de adultos. Sua mãe, Lindinalva da Silva, já morta, foi até a quarta série do ensino fundamental, o suficiente para trabalhar como empregada doméstica.
Aos poucos, Mirian mais avançava nos estudos e percebia que podia ir além do que a expectativa que sua família depositava nela.

"Nunca houve na minha criação a cobrança para ir bem nos estudos. A expectativa da família, e até a minha própria, era apenas a de que eu concluísse o ensino fundamental, casasse e conseguisse um emprego que não fosse de doméstica", afirma. Ela se matriculou em um curso pré-vestibular comunitário na favela Dona Marta (zona sul do Rio), onde vive, e demorou três anos até conseguir uma vaga no curso de serviço social na Universidade Veiga de Almeida, por meio do ProUni (Programa Universidade para Todos).

Em 2006, ela está se preparando para trocar de faculdade, pois conseguiu uma bolsa de estudos na PUC do Rio. "Em muitos momentos, eu me sentia desestimulada. Nenhum dos meus três irmãos tinha, até então, completado o ensino fundamental. A maior vontade de mudar isso veio de mim mesma." A entrada no ambiente acadêmico, tem ocorrido sem traumas: "Achava que ia encontrar na faculdade muita gente de nariz em pé. No entanto, tive um acolhimento muito bom".

Diferença é menor entre raças

No quesito racial, outras pesquisas têm demonstrado que, apesar da distância que separa os grupos ainda ser grande, tem havido redução na desigualdade. Neste ano, um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) feito pelos pesquisadores Maurício Cortez Reis e Anna Risi Crespo mostrou que diminuiu a diferença salarial entre negros e brancos entre gerações. Em 1990, um branco entre 48 e 50 anos, por exemplo, ganhava 130% a mais do que um negro da mesma idade. Doze anos depois, a diferença salarial nesta faixa etária caiu para 90%. Entre 24 e 26 anos, a diferença no rendimento em 1990 era de 62% a favor dos brancos. Em 2002, caiu para 55%. Para os pesquisadores, o principal fator que explicava a queda era a redução da discriminação no mercado de trabalho.

Apesar dos avanços, a desigualdade é evidenciada quando se compara a proporção de pretos e pardos em cada profissão no Censo 2000 do IBGE. Quanto mais valorizada é a ocupação, menor é a proporção de negros. O Censo mostra que há apenas 8,9% de dentistas negros, 9,7% de arquitetos, 10,2% de médicos e 12,9% de juízes. Já entre pescadores e caçadores, no entanto, a proporção chega a 72,3%. Entre garimpeiros, são 70,6%, e, entre ajudantes de obras, 60,4%. A comparação do rendimento mostra também que em 92% das 509 profissões do Censo negros ganham menos do que brancos.