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Esse blog é destinado a promover o debate de temas culturais e sociais, além de divulgar as ações realizadas por jovens moradores da comunidade São Remo, no bairro do Butantã (SP).

domingo, novembro 27, 2005

A TV QUE PODE SER LIDA

TV Cultura acerta o tom no programa ‘Entrelinhas’, que visita o universo dos livros, sob o comando de Paula Picarelli

Na adolescência, Paula Picarelli não era muito chegada aos livros. Dizia que não tinha paciência para eles e que achava perda de tempo ficar em um lugar parada, isolada, lendo. Certo dia, leu numa entrevista a seguinte dica: um bom livro para quem está começando a gostar de ler é O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway. Correu até uma livraria, comprou um exemplar e conseguiu lê-lo até o fim. Mas o interesse pelas letras, digamos assim, se deu mesmo aos 19 anos, quando entrou na faculdade. Encantou-se com os pensadores do teatro. E devorou O Teatro e a Peste, de Antonin Artaud, e textos do dramaturgo italiano Eugênio Barba.

A moça que ganhou fama nacional como uma das lésbicas da novela Mulheres Apaixonadas, de Manoel Carlos, hoje comanda – e não é força de expressão – o programa literário Entrelinhas. Está lá, na TV Cultura, sempre aos domingos, às 21h30, com reprise às segundas, às 22 horas. Põe em foco não só os clássicos da literatura e os lançamentos mais anunciados, mas também ousa. Abre brechas para novatos que não raramente se perdem na obscuridade do mercadão de livros.

Para entender melhor o perfil do semanal, ela explica, convidativa que é: “Eu sempre falo que o Entrelinhas é um programa sobre literatura, aliás, o primeiro da TV aberta brasileira. Mas falar que a equipe saiu do Metrópolis já dá a entender a linha do programa. É literatura leve, com linguagem atual, sem preconceito e sem simplificações.”

Embora o tema seja fascinante, literatura não é dos assuntos mais fáceis de se tratar, principalmente no que diz respeito a novos escritores. Apresentar o Entrelinhas é um processo contínuo, conta. É assistir a cada programa, observar o que foi bom ou não, até encontrar o melhor tom. E, como ela aqui não faz exatamente uma personagem, o ideal é relaxar de todo para ser o mais natural possível. “Sempre faço uma pesquisa rápida sobre os temas que vou apresentar”, conta Paula. “Quem faz as entrevistas com os escritores é o Ivan (Marques, redator-chefe) que é também quem faz a pauta. Ele acabou de defender uma tese de doutorado em literatura, é superfera.” E dá-lhe reunião de equipe. É preciso saber como o programa vem sendo recebido e, elementar, o que as pessoas estão lendo fora da tela.

O desafio, com toda a licença ao clichê que o termo representa, é não deixar o programa pesado, mas também não torná-lo superficial. E como conseguir esse equilíbrio? É uma equação que o próprio público cobra do programa. “Numa pesquisa recente descobriu-se que o Entrelinhas é um dos únicos programas que trouxeram um público jovem que não assistia à TV Cultura. É o balanço entre leveza e profundidade que agrega valor ao programa.”

Da série de cenas divertidas, Paula cita uma com o escritor Reinaldo Moraes. E, claro, quando se conhece esse outro lado da literatura, o interesse logo vem à tona. “A maioria das entrevistas é feita na casa das pessoas. O programa fica gostoso, com um clima de cozinha lá de casa.”

Química
O Entrelinhas é uma conjunção de elementos que deu certo: roteiro, pauta, produção, apresentação e, claro, a seleção de entrevistados. Diz Paula que a receita vingou, no caso específico de sua performance, porque desde o início o segredo sempre foi colocar-se no papel de aprendiz. “Estar com essa equipe significa estar em um lugar de aprendizado, de saber, de respeito, trabalhar perto de ótimas pessoas”, completa.Dito assim até parece bajulação, mas a moça fala com efeito. Sabe convencer a platéia.

*Matéria publicada no Caderno TV&LAZER, do jornal O Estado de S. Paulo, de 27/11/2005.